Susana Menezes

Sejam bem-vindos ao Teatro Luís de Camões

Susana Menezes

No Dia Mundial da Criança, a 1 de junho, abre ao público, na Calçada da Ajuda, o primeiro teatro municipal com programação inteiramente dedicada a crianças e jovens. Ao leme do Teatro Luís de Camões – que conta ser também reconhecido como LU.CA (Lugar para as Crianças para os Jovens e para as Artes) – vai estar Susana Menezes, a mulher que, ao longo dos últimos dez anos, dirigiu com mérito indiscutível e sucesso junto do público de palmo e meio (e não só)! a programação infantojuvenil do Teatro Maria Matos.

Um teatro municipal exclusivamente dedicado aos mais jovens é algo inédito em Portugal…

A abertura deste teatro resulta de um investimento da Câmara Municipal de Lisboa na formação de públicos para as artes. Naturalmente, pelas relações com a natureza do próprio edifício, vai ter um foco central na programação performativa, mas haverá um espaço alargado para o seu cruzamento com outras formas e expressões artísticas, como as artes plásticas, a música, o design, a arquitetura, a ilustração, etc. No fundo, a possibilidade de existir um lugar para as crianças, para os jovens e para as artes permite que estes cruzamentos sejam facilitados.

 

É um desafio acrescido, mesmo para alguém com a sua experiência, programar para este espaço?

Desde 2001, quando me iniciei como programadora no Teatro do Campo Alegre, o meu caminho foi sempre de aprendizagem, , de procura, de tentativa e de erro, tendo a noção de que hoje falho menos. Isto sem ter deixado de arriscar. Aliás, creio que o risco deve sempre fazer parte da natureza da programação artística. Portanto, ao fim destes anos e, sobretudo, após esta longa experiência no Maria Matos, sinto-me preparada para continuar a crescer, a aprender e a fazer boas descobertas. E, claro, estou muito feliz pelo reconhecimento e por acreditarem no meu trabalho.

 

É muito importante falarmos, precisamente, destes últimos dez anos, ainda mais porque o Teatro Luís de Camões é o próximo passo de crescimento de um projeto que nasce no Maria Matos…

Foram dez anos ao lado de uma equipa incrível, e que deu frutos. Muitas vezes parecemos estar pouco atentos à programação para os mais jovens – de facto, as crianças não votam e não têm voz na opinião pública –, mas a nossa equipa do Maria Matos conseguiu inscrevê-la. Tanto que o nascimento deste novo teatro se deve muito ao Mark Deputter. Por um lado, pela profunda confiança que sempre depositou em mim, por outro, pelo esforço que eu e ele fizemos para encontrar um espaço para que o programa Crianças e Jovens do Maria Matos pudesse crescer. Importa lembrar que, no Teatro Maria Matos, não só coabitávamos num espaço muito partilhado, como era na sala de ensaios, com meros 30 lugares, que nos instalávamos. Parecia quase uma espécie de laboratório onde os espetáculos nasciam para depois crescerem em circulação por outros palcos…

 

“Este teatro tem tudo aquilo que um outro teatro tem, mas em pequenino.”

 

No Maria Matos, a programação infantojuvenil dialogava muitas vezes com as criações para os outros públicos. Agora, não haverá essa âncora…

Esse é o desafio maior, e as equipas são fundamentais, até porque o nosso trabalho se afirma como um coletivo. Tanto que, agora, serei eu e quem me acompanha a quem caberá pensar em tudo. Como já referi, há o foco principal nas artes performativas, do qual surgirá um outro, paralelo, que terá uma relação permanente com o que acontece no palco. Isso poderá ser já testemunhado nos dias de inauguração do Teatro Luís De Camões, a 1, 2 e 3 de junho. A partir das fábulas de Esopo, construímos um programa com um concerto, uma performance, uma exposição, visitas, etc. Teremos também o arranque da Biblioteca do Público – Livros Espetaculares Mesmo!, um projeto com curadoria de Sara Amado que consiste em propor, regularmente, uma pequena biblioteca com livros que existem na órbita do espetáculo em cena e que pretende desafiar o público a procurar novas leituras, e outros entendimentos, sobre aquilo que estamos a ver.

 

Depois desses dias de inauguração, inicia-se um ciclo muito especial e que recupera, de certo modo, a memória dos últimos anos do Maria Matos…

É verdade. É um ciclo que se vai estender ao longo dos próximos meses e que intitulámos Dez Espetáculos de Dez Anos de Programação para Crianças e Jovens do Teatro Maria Matos, constituído por criações que importa repor por várias razões. Uma delas, para realçar a sua importância naquilo que foi o projeto do Maria Matos; por outro, sentimos que estes espetáculos mereceriam voltar a ser vistos com condições melhoradas, as quais este novo teatro irá permitir. E será muito interessante ver como esses espetáculos, que integravam uma área de programação, se passam a comportar como o foco central e da qual vão derivar outras relações, cumplicidades, encontros e cruzamentos.

 

E esse ciclo abre com um Shakespeare…

Nem mais. Até porque, diz-se, um teatro deve abrir as suas portas com um Shakespeare. Neste caso será o espetáculo do Teatro Praga Hamlet sou eu, que subirá ao palco a 17, 23 e 24 de junho. E, atenção, até julho, toda a programação é de entrada livre.

 

Falemos do espaço. Estamos perante um edifício setecentista, recuperado e renovado através de um projeto dos arquitetos Manuel Graça Dias e Egas José Vieira [que projetaram, por exemplo, o Teatro Municipal Joaquim Benite, em Almada]…

Este teatro tem tudo aquilo que um outro teatro tem, mas em pequenino, como que a dizer para quem se destina. Dito de outro modo, é um teatro à italiana, com uma escala toda ela muito confortável: a sala tem 131 lugares, tem pequenos camarotes que parecem casinhas… é o sítio perfeito para pais e filhos partilharem experiências únicas e criarem memórias afetivas, e efetivas. Que seja, em suma, um local para as boas memórias!

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