Esta cidade…

O Teatro Meridional conta "Histórias de Lx"

Esta cidade…

Aqui estão “as pessoas que nos passam pela vida nesta cidade”, anuncia Natália Luiza, que dirige, em palco, 25 atores para contar Histórias de Lx. A mais recente criação do Teatro Meridional é um olhar divertido, mas também melancólico e comprometido, quase sem palavras, sobre uma Lisboa que parece saída de tiras de banda desenhada. Para ver, a partir de 5 de junho, no Teatro São Luiz.

 

Dos subterrâneos às movimentadas ruas de um qualquer bairro da cidade, lisboetas de hoje, residentes ou em trânsito, turistas de trolley ou ocasionais visitantes, todos vivem um dia buliçoso nesta nossa Lisboa. E nada, nem ninguém falta à chamada no novo espetáculo do Teatro Meridional.

Ainda o dia não raiou e já as senhoras da limpeza chegam à cidade, vindas dos bairros periféricos; um grupo de jovens amarga a ressaca de uma noite de copos; uma ou outra pessoa surge em passo acelerado para chegar ao emprego; um homem passeia o cão e uma jovem faz jogging para manter a silhueta escultural…

Chega um turista, e depois outro… e outros, muitos outros. Encantam-se e tudo fotografam, e partilham nas redes sociais. Lisboa está mesmo na moda, e até as tascas deixaram de ser tascas para se transformarem em restaurantes gourmet com assinatura de chef

Que entrem os turistas, que a cidade mudou de vez. Que o diga a senhora que mora só, ou aquela que espera infinitamente pelo autocarro. E lá vêm as trotinetes, e até políticos a prometerem quimeras enquanto os vizinhos do lado deixam a casa onde viviam porque esta Lisboa é cada vez menos para quem cá mora…

Sucedem-se os personagens: o polícia e um vendedor ambulante; um fiscal de estacionamento; um ambicioso vendedor de imóveis que, se puder, até vende o miradouro de onde os apaixonados contemplam o Tejo. E lá está o investidor chinês a trazer capital estrangeiro à capital que outrora foi do império. Menos glamorosos, o pedinte e a romena com um filho ao colo; ou o artista de rua que tenta seduzir turistas na esplanada; ou o cantoneiro que faz os possíveis para manter a rua limpa, muito embora sem sucesso; ou as pessoas comuns dos bairros, últimos resistentes (até quando?) do fenómeno de gentrificação…

Todos são protagonistas nestas Histórias de Lx que desfilam aos nossos olhos como tiras de banda desenhada, sucedendo-se a um ritmo frenético. Personagens que contam as suas pequenas histórias quotidianas através de movimentos coreográficos que dispensam, quase sempre, as palavras.

Quase todas mostram como é fácil amar Lisboa, com aqueles seus contrastes entre o tradicional e o moderno, com a sua diversidade pincelando as ruas de cores e de cheiros de cá e de todo o mundo. Mas, estas Histórias de Lx comportam também o drama daqueles que sentem o seu amor não correspondido. São muitos a experenciar uma cidade que não os quer por cá. Nem nos restaurantes, nem nos miradouros e nas ruas estreitas dos bairros típicos, nem mesmo nas casas onde nasceram, cresceram, viveram e, num mundo mais justo, teriam o direito de morrer.

O aparente olhar festivo, que o desfile incessante de personagens parece evidenciar, vai sendo imbuído de melancolia e inquietação. Sem comprometer o tom poético que é timbre das criações do Meridional, as mensagens ganham formas mais explícitas. Por isso, perguntámos à encenadora Natália Luiza se este é um espetáculo político. “É um espetáculo onde assumimos um posicionamento, um comprometimento com a cidade através do teatro”. Nada mais premente, ainda mais, no mês em que Lisboa se festeja nas ruas.

Inserido no programa de comemorações dos 125 anos do Teatro Municipal São Luiz, Histórias de Lx está em cena de 5 a 16 de junho, na Sala Luís Miguel Cintra.