Voltar a “Metropolis” com Filipe Raposo

O clássico de Fritz Lang no Teatro São Luiz

Voltar a “Metropolis” com Filipe Raposo

Passados 91 anos sobre a estreia em Lisboa, a sala principal do Teatro São Luiz volta a receber, de 15 a 17 de novembro, um dos mais assombrosos filmes da história do cinema: Metropolis, de Fritz Lang. O clássico do mudo ressurge em todo o seu esplendor com uma nova banda sonora, executada ao vivo pelo compositor e pianista Filipe Raposo e 14 músicos da Orquestra Sinfónica Portuguesa, conduzidos pelo maestro Cesário Costa.

Antes de dirigir Metropolis, Fritz Lang era já um dos mais reputados cineastas alemães do seu tempo, autor do enorme sucesso Dr. Mabuse, o Jogador, dirigido em 1922, e que viria a dar origem a duas sequelas. Não seria pois de estranhar que, pouco tempo depois, Lang recebesse luz verde para dirigir Metropolis, naquele que seria o maior investimento de sempre da UFA (Universum Film AG), produtora germânica que ambicionava conquistar o mercado americano.

Como lembra Filipe Raposo, músico a quem, quase 100 anos depois, o Teatro São Luiz desafiou a compor uma nova partitura para Metropolis, “Lang faria, em meados dos anos 20, uma viagem a Nova Iorque que se revelaria vital para o filme”. Nessa viagem ao “Novo Mundo”, pronunciado pelos esmagadores arranha-céus de Manhattan, Lang e a mulher, a argumentista Thea von Harbou, inspiraram-se para escrever a história de uma cidade onde a classe privilegiada domina a partir dos arranha-céus, e os operários são levados para os subterrâneos a fim de manterem vivas as máquinas que fazem mexer a cidade.

Toda a produção foi épica, envolvendo milhares de figurantes e meios nunca antes vistos. Porém, nem a UFA conquistou a América, nem Lang veria estrear nas salas o filme com que sonhou. Por imposição de censores e produtores, Metropolis chegou aos cinemas resumido a pouco mais de 80 minutos, versão essa que terá estreado no São Luiz Cine, em 1928, com o maestro Pedro Blanch a dirigir uma orquestra de câmara que executa a partitura de Gottfried Huppertz.

Tratando-se de uma encomenda do São Luiz ao compositor e pianista Filipe Raposo como evocação à estreia do filme naquela sala, por ocasião da comemoração dos 125 anos do teatro municipal, a versão que vamos agora encontrar é um pouco mais longa, com cerca de duas horas, correspondente àquela que circulou entre os anos 40 e 80 do século passado. “Optámos por esta, e não pela mais recente – a de duas horas e meia –, porque é a que está mais próxima da que aqui estreou.”

Apesar de já ter acompanhado ao piano por diversas vezes o filme de Lang, este Metropolis – Filipe Raposo meets Fritz Lang é, para Raposo, “algo completamente novo”. “O desafio era compor uma nova partitura para os 120 minutos de filme, para o mesmo número de músicos que aqui estiveram em 1928”. O ensamble de câmara proveniente da Orquestra Sinfónica Portuguesa será conduzido pelo maestro Cesário Costa.

Num trabalho de composição que se prolongou “por mais de três meses”, Raposo pretende que a sua música consiga “retratar o futuro, trazendo a Metropolis” as referências do presente. Por isso, o compositor considera que a sua banda sonora se afasta radicalmente da de Gottfried Huppertz, “porque a minha visão do filme, histórica e sociologicamente, é necessariamente outra.”

O compositor elencou três grandes temáticas abordadas no filme que trespassam a sua partitura. Primeiro, “as cidades e o futuro”, com toda aquela “verticalidade arquitetónica” refletindo-se na música. Em segundo, as lutas de classes, “representadas com muita agitação”. Por fim, o tema da paixão e sedução, “transversal tanto no domínio emocional como no domínio do poder, e onde a minha música revisita compositores como Bach ou Jean-Philippe Rameau, na qual existe uma ideia de sedução intrínseca, ligada a melodias sinuosas e harmonias muito equilibradas.”

O encontro de Filipe Raposo com as imagens do futuro imaginado por Fritz Lang promete, assim, uma experiência assombrosa entre a música de hoje e de amanhã e a intemporalidade do grande cinema na mais nobre das salas do Teatro São Luiz.