José Condessa e Bárbara Branco

Os atores interpretam Romeu e Julieta

José Condessa e Bárbara Branco

José Condessa e Bárbara Branco dão corpo e alma aos eternos amantes de Verona, Romeu e Julieta. A tragédia de William Shakespeare regressa aos palcos portugueses, numa encenação de João Mota. O jovem e belo par de protagonistas fala-nos desta nova produção, em cena no Teatro da Trindade até ao próximo dia 9 de junho.

Têm ambos formação de atores na Escola Profissional de Teatro de Cascais. O que devem a esta instituição e à figura de Carlos Avilez?

José Condessa: A escola tem formado imensos atores ao longo dos anos e tem um leque excepcional de professores que continuam a exercer a sua profissão, e que por isso estão atualizados no tempo. Essa é uma das grandes marcas da escola. O Carlos Avilez, enquanto pessoa e encenador, é quem nos lança no teatro profissional e quem tem apostado mais em nós ao longo destes anos.

Barbara Branco: Devo-lhe a minha carreira toda. O Carlos é o responsável pelo respeito que temos pela profissão, pelo palco e pela representação em si. O Carlos foi o mestre que tivemos e que nos passou tudo isso.

Popularizados pela televisão, consagram uma parte importante da vossa carreira ao teatro. Porquê?

JC: O teatro é a base. Fiz uma formação em teatro, não em televisão ou cinema. No entanto, considero que se um ator souber representar nas três vertentes é um ator completo. Mas acho que a base é sempre o palco pelo contacto direto com o público, pela dificuldade, pela complexidade das personagens e, acima de tudo, pelos grandes textos que temos oportunidade de reviver.

BB: Mais do que gostar, eu preciso de fazer teatro. Acaba por ser a raiz. O teatro dá-nos um contacto com o público que é o nosso maior juiz. O público dá-nos uma emoção e um contacto direto que não temos em televisão e isso é muito importante para um ator, sobretudo para um ator que está a começar.

Ao representar Shakespeare, qual o maior desafio?

JC: Shakespeare é quase perfeito. No Hamlet, por exemplo, que é praticamente a bíblia do teatro, encontramos respostas para quase tudo, até o “teatro dentro do teatro”. Shakespeare, a meu ver, é um autor que acima de tudo entende o ator. Tem uma grande proximidade com a palavra que encaixa facilmente na boca do ator. O texto é sempre muito belo e possui uma grande força. Representar Shakespeare é uma responsabilidade.

BB: Creio que a maior dificuldade de fazer Shakespeare é justamente acartar com a responsabilidade de o representar. Tirando isso, as suas peças são muito generosas para com o ator, no sentido em que o texto nos dá tudo e não precisamos de fazer grande coisa para além de o ler e saborear.

Mais de quatrocentos anos depois, o que mantém Romeu e Julieta atual?

JC: Tudo. Os temas são universais. Morte, vingança, amor/desamor, guerra, ambição, são as palavras-chave das tragédias de Shakespeare. No Romeu e Julieta, o amor, o desencontro e a morte, são as palavras que mais se ouvem ao longo da peça. O amor é sempre universal e intemporal.

BB: Um amor na sua forma mais pura e inocente. No fundo eles são crianças. A Julieta tem 14 anos e o Romeu 16. Um amor hipoteticamente contrariado, porque, afinal, os pais de ambos nunca sabem que ele existe.

A propósito, Julia Kristeva salienta o facto de esse amor nascer do ódio das famílias opostas e de ser propiciado pela noção de interdito e de secretismo. O que pensam?

JC: A nível dramatúrgico isso é verdade. Tudo começa por um desafio: Romeu surge no baile de máscaras da família inimiga onde não devia estar. E, como são jovens e vivem intensamente, conhecem-se, apaixonam-se e morrem em três dias. Se não houvesse ódio, não havia morte e, se calhar, também não havia amor.

BB: Eu vejo o amor da Julieta como algo tão inocente que não consigo pensar no outro lado. Se não houvesse este ódio, será que este amor era igualmente intenso e levado ao limite? É possível…

Para José Condessa, “morte, vingança, amor/desamor, guerra, ambição, são as palavras-chave das tragédias de Shakespeare”. Aqui, uma cena de Romeu e Julieta, na encenação de João Mota. (fotografia de Filipe Ferreira)

 

O facto de serem namorados na vida real ajuda-vos a personificar os eternos amantes de Shakespeare?

JC: Sim e não. A parte boa é que não há barreira a quebrar no sentido de conhecer o colega. E a nível físico, os beijos. Mas, por outro lado, já nos conhecemos e já não se dá a descoberta do outro.

BB: Nós como atores, antes de namorarmos, já nos dávamos muito bem em cena. O facto de namorarmos torna tudo mais rápido porque o contacto físico e a relação com o colega já existe.

JC: No fundo, acho que não ajuda a personagem, mas ajuda o ator porque é uma segurança.

Que contributo pessoal podem trazer a estas personagens tantas vezes representadas?

JC: Para o bem e o mal, é o nosso. Acima de tudo temos muita confiança no nosso trabalho e sentimos ter uma boa peça para mostrar. Temos um elenco muito jovem que torna a peça muito ágil. Estou muito orgulhoso.

BB: Não há atriz com a minha história, com o meu passado, e esse é um contributo singular na forma de experienciar este texto e esta personagem.

Bárbara Branco ao lado da atriz Manuela Couto. (fotografia de Francisco Ferreira)

 

Já tinham representado Como Vos Aprouver . Que diferenças encontram na abordagem de Carlos Avilez e de João Mota ao universo shakespeariano?

BB: Apesar de tudo têm linguagens muito semelhantes. O nascimento da Comuna e do TEC (Teatro Experimental de Cascais) é coincidente e contemporâneo. São ambos muito clássicos e transmitem coisas semelhantes por métodos diferentes. O João Mota, porque foi ator, comunica com uma perspetiva de ator. Um dia tínhamos ensaio corrido à noite e à tarde ficámos a jogar à macaca e ao jogo do lencinho. Ele transmite-nos muito este lado de brincar, brincar a sério, brincar ao teatro. E isso mantém-se na peça, porque o teatro é um jogo.

JC: Essa é a marca do João Mota. O primeiro ato parece comédia, repleto de amor, de brincadeira, e também de muito erotismo. Só o segundo ato é que é trágico do princípio ao fim.

Que aspeto da encenação de João Mota gostariam de salientar?

JC: O cenário [de António Casimiro] é muito bonito, exactamente o que existia no Globe no tempo de Shakespeare: duas colunas, três portas e uma varanda. Toda a encenação parte daí, exigindo que as mudanças do espectáculo sejam feitas através da música original de José Mário Branco que não incorpora voz, mas usa muitos elementos de ranger de portas, bater de gavetas, espadas, gritos e assobios que nos transportam numa extraordinária viagem sensorial. É isso que dá o mote à cena…

BB: E o trabalho de luz do Paulo Graça.

Qual o papel que sonham representar no teatro?

JC: Como alguém já disse, é sempre próximo.

BB: Todos os que vierem. Proximamente, a Lulu de Wedekind que vou representar em Setembro, no TEC, sob a direção do Carlos Avilez.