Os livros de junho

Os livros de junho

Oito propostas de leitura para todos os gostos. Do romance histórico ao conto, da literatura de viagem ao fantástico, sem esquecer a poesia e os mais novos. Miguel Real e o seu brilhante diário ficcionado da rainha D. Amélia, as curtas narrativas de Melville, o universo surreal de Maurice Sandoz, o relato originalíssimo da viagem à América de Gonçalo M. Tavares e 19 sugestões de percursos naturais à volta de Lisboa. A poesia está presente com os haikus inspiradores de Kobayashi Issa e com o primeiro volume poético de Lídia Jorge. Uma tocante metáfora subaquática de João Pedro Mésseder representa a literatura infanto-juvenil. Bons livros não faltam, não queremos que faltem os leitores!

Miguel Real

As Memórias Secretas da Rainha D. Amélia

O romance As Memórias Secretas da Rainha D. Amélia divide-se em duas partes inteiramente distintas. A primeira, num estilo próximo da sátira, na qual o próprio autor se ficciona, narra as circunstâncias do aparecimento do suposto manuscrito da última rainha de Portugal. A segunda parte, reproduz o texto integral das memórias. Com um engenho estrutural algo insólito, este romance histórico constitui um impressivo olhar sobre o Portugal finissecular de oitocentos até aos anos 50 do século XX, visto sob a perspetiva de Amélia de Orleães, a rainha que pisou o solo português “com o pé esquerdo”, “crente que podia mudar o destino deste povo atarracado, que desprezava a água pela manha, jogava o leite aos porcos e sorvia sopas -de-cavalo-cansado, fugia dos médicos e depunha a sua saúde nas mãos de bruxas velhas e endireitas, cumprindo infindáveis promessas a Nossa Senhora da Saúde”. Sob a pena de Miguel Real, D. Amélia revela-se uma fina observadora do Portugal que conheceu, severa para com as suas instituições e elites, mas sempre compassiva para com as agruras do seu povo.

Dom Quixote

 

Herman Melville

Ficção Curta Completa

Bartleby é um escrivão de Wall Street, ao serviço de um escritório de advogados, que se recusa a prestar qualquer tipo de trabalho com uma espécie de demente obstinação. O advogado e os outros escrivães aceitam com surpreendente passividade a decisão de Bartleby. Jorge Luís Borges compara o romance Moby Dick, também da autoria de Herman Melville, com este conto, encontrando “semelhanças na loucura dos dois protagonistas e na incrível circunstância de uma tal loucura contagiar todos os que os rodeiam”. Bartleby, o Escrivão é um dos 21 textos inseridos neste volume que reúne, pela primeira vez em língua portuguesa, a totalidade da ficção curta de Melville e inclui outras narrativas célebres como Billy Budd, Benito Cereno ou As Encantadas ou Ilhas Encantadas. Recolha essencial para ficar a conhecer melhor a obra do grande escritor apaixonado pelas histórias de marinheiros e do mar, às quais acrescenta uma dimensão metafísica e alegórica, fascinado pelo tema do mal e pelos aspectos mais sombrios da natureza humana.

E-Primatur

 

Kobayashi Issa

Os Animais

O haiku é formalmente, um poema japonês de três versos composto de um total de dezassete silabas (5-7-5). Este terceto é normalmente um veiculo poético transportador de duas imagens contrastantes entre si. Conciso e poderoso, evocativo e imagético, o haiku foca-se na natureza que serve de espelho ao mundo interior do poeta, estabelecendo um jogo de reflexos entre estados de alma e observações sensíveis. No Ocidente o haiku tem sido quase sempre entendido em função da sua espiritualidade ligada ao budismo zen. Roland Barthes considerou-o como o ramo literário da aventura espiritual do zen. Porém, o filósofo coreano Byung-Chul Han salienta que “o haiku é mais um jogo que diverte do que uma aventura espiritual ou linguística”. Estas duas vertentes estão bem patentes nos haikus de Kobayashi Issa (1763-1828), que compõem esta selecção inteiramente dedicada ao tema dos animais. Na realidade, no âmbito do motivo que unifica esta recolha, é possível encontrar poemas para cada momento da existência humana, da dor à alegria, da solidão à partilha, do nascimento ao momento da morte.

Assírio & Alvim

 

Gonçalo M. Tavares

Na América, Disse Jonathan

Escrito por Franz Kafka em 1910 e publicado em 1927, Amerika é um lugar encenado na literatura, uma recriação simbólica do mundo pela imaginação, um país ao mesmo tempo imaginário e real. Mais de um século depois, Gonçalo M. Tavares empreende o projecto Kafka, uma viagem à América acompanhado de uma fotografia do escritor. Poderá a presença fantasma de Kafka alterar a paisagem? Jonathan é o seu interlocutor e enigmático parceiro de viagem que leva o autor a questionar se ele “existe mesmo ou se simplesmente vim sozinho aos Estados Unidos com o retrato de Kafka”. O trajeto, de Venice Beach, ao Grand Canyon, do deserto do Arizona aos Everglades, das florestas do Moro Rock Trail ao Cape Canaveral, dá corpo a este diário-ficção. Mas a viagem insinua-se também pelo interior de um estilo de vida: o jogo em Las Vegas, o cinema, a publicidade, a propaganda, o consumo, a tecnologia, a religião e a ciência. E a imagem de Kafka feita presença, introdutora de estranheza e de questionamento. Porquê? “Uma pergunta que é de certa maneira uma acusação”.

Relógio D’Água

 

Robert Butler e Andy Mumford

Além Lisboa

A história geológica de Lisboa é talvez o seu segredo melhor guardado. Algumas das maravilhas naturais desvendadas neste livro, de cascatas a grutas, de picos a pegadas de dinossauro, são quase desconhecidas e consequentemente, muito pouco frequentadas. A cerca de uma hora de automóvel da capital os percursos sugeridos proporcionam uma oportunidade de escapar ao bulício da cidade numa jornada de aventura para todos os amentes da natureza. Além Lisboa apresenta 19 percursos pedestres, acessíveis até para caminhantes pouco experientes, nas áreas a Oeste e a Sul de Lisboa. Com mapas detalhados (e disponíveis para download) e indicações práticas sobre como chegar e locais de interesse próximos a visitar em cada local, cada passeio indica ainda pontos de interesse histórico e geológico na belíssima paisagem acessível a quem quiser, neste verão, caminhar um pouco mais para além de Lisboa.

Arte Plural

 

Lídia Jorge

Livro das Tréguas

Ficcionista com uma carreira invulgar, reconhecida em Portugal e no estrangeiro, Lídia Jorge tem vindo a escrever poesia desde há muito tempo, porém não tinha publicado qualquer livro até ao presente. Desse vasto conjunto, a escritora seleccionou 50 poemas, os quais agrupou nas cinco partes em que se divide este O Livro das Tréguas: Com a Origem, Com os Preceitos, Com os Factos, Com as Fábulas, Com o Tempo. Escritos em datas diferentes, e em resultado de diferentes estados de espírito, foram aqui reunidos com uma unidade cronológica que corresponde, no dizer da própria Lídia Jorge, a uma espécie de autobiografia consentida. Do universo puro da infância ( “Veneno não havia. O grande perigo passava voando / por cima das nossas cabeças e nós não o pressentíamos. / Nunca, no nosso paraíso, encontrámos Adão ou Eva.”) à tomada de consciência da condição humana (“Mas a fome chega pela manhã / e de novo vamos à caça”), da guerra e da finitude (“Quando eu decido, ninguém morre”).

Dom Quixote

 

Maurice Sandoz

Recordações Fantásticas e Três Histórias Singulares

Cientista, compositor e nome cimeiro da literatura fantástica suíça, Maurice Sandoz foi uma das mais fascinantes figuras dos meios culturais europeus de meados do século XX. A sua escrita navega os territórios sombrios da alma humana, sempre na vertigem entre a demência e a ciência. A recreação do universo imagético destas suas histórias, uma colecção de contos fantásticos com uma leve aura de surreal, ficou a cargo de Salvador Dali, que desenhou as ilustrações especificamente para esta obra. Este é o volume escolhido para iniciar a segunda “encarnação” da Colecção Livro B precisamente para trazer novamente aos leitores de língua portuguesa o cunho do surrealismo europeu que a marcou transversalmente. A pintora Leonora Carrington acusou a recepção deste livro, ao autor, da seguinte forma: “Meu amigo, recebi a sua nova colecção de pesadelos que teve a amabilidade de enviar. Habitualmente não durmo bem, mas agora não durmo porque não quero.”

Livro B

 

João Pedro Mésseder

O Aquário

Num grande aquário, pousado numa mesa comprida ao canto de uma sala, vivem cinco peixes. Mas, tal como no mundo dos humanos, também naquele mundo subaquático há problemas. Ali, as diferenças de cor, tamanho e idade geram preconceitos e ideias falsas, que levam a situações tristes e desconfortáveis. Com ilustrações de Célia Fernandes, esta história de peixes promete mostrar que, apesar de diferentes, somos todos iguais. João Pedro Mésseder tem publicado poesia e obras para crianças, algumas delas premiadas. Um dos seus livros infantis foi nomeado, em 1999, para a Lista de Honra do IBBY de 2000.

Caminho