A tragédia de Troia nas Ruínas do Carmo

Maria Rueff protagoniza “Troianas” de Eurípedes

A tragédia de Troia nas Ruínas do Carmo

O texto canónico do teatro antibelicista, escrito no século V a.C. por Eurípedes, é a proposta do Teatro do Bairro para o assombroso cenário das Ruínas do Convento do Carmo este verão. A partir de uma nova tradução de Luísa Costa Gomes, o encenador António Pires entrega o papel de Hécuba a Maria Rueff.

Como foram selvagens os Gregos quando, movidos pela soberba e pela ganância, arrasaram Troia. As feridas da longa guerra, que através de um cavalo de pau foi vencida pelo invasor, estão agora em sangue nos corações das mulheres troianas, a que Hécuba, “a outrora celebrada rainha de Troia”, dá voz: “perdi tudo: o meu país, os meus filhos, o meu marido.”

Tratadas como despojos de guerra, as mulheres troianas aguardam pelo destino que os deuses (e os Gregos) lhes reservam: a escravidão. É o drama delas, entre as ruínas físicas e psicológicas que lhes infligem, que faz de Troianas uma tragédia de mulheres que mais de dois milénios depois de Eurípedes a ter escrito continua a ser o texto canónico do teatro antibelicista.

“A nossa decisão de levar a cena este texto foi tomada há cerca de quatro anos e é bastante natural que toda a conjuntura que se vivia e, infelizmente, persiste, tendo-se até agravado, tenha pesado na escolha”, refere António Pires, lembrando a subida ao poder de Donald Trump, as guerras na Síria e em países do Magrebe e, consequentemente, a crise migratória que provocou uma sucessão de tragédias.

Em Troianas está contida toda essa “componente social e política” que, agora, através de uma nova tradução de Luísa Costa Gomes (feita a partir da de George Theodoridis em língua inglesa e depois revista com Tim Eckert, a partir do grego) tornou esta “peça clássica mais simples, mais direta”. Essa é, aliás, uma das virtudes que Pires ressalva nesta versão, a qual permite ao público “visualizar inteiramente cada palavra e apreender com muita facilidade as ideias do autor”. Se bem que, como sublinha Luísa Costa Gomes na folha de sala, Eurípedes era já de si “muito pouco dado aos enfeites. Nem se pediam enfeites em temas tão dolorosos.”

Numa peça em que as grandes protagonistas são as mulheres, António Pires quis reunir algumas das atrizes com quem trabalha regularmente e muito admira. Para além de Rueff, o encenador entregou a Alexandra Sargento o papel de Cassandra, e a Sandra Santos o de Andrómaca. À jovem atriz Vera Mora, que volta a trabalhar com Pires, depois de ter participado em Ubu Rei ainda enquanto aluna da ACT, ficou reservado o da bela e traiçoeira Helena de Esparta.

Quanto à escolha de Maria Rueff para o papel de Hécuba, o encenador destaca “a capacidade inigualável que os comediantes têm para fazer tragédia. E a Maria tem tudo: tem a força, tem o nervo e tem a energia que leva a personagem a estar sempre no limite.”

Em cena até 17 de agosto, Troianas conta ainda com interpretações de João Barbosa, Hugo Mestre Amaro, Francisco Vistas e de alunos finalistas do curso de representação da ACT-Escola de Atores.