Monday

'Underwater, feels like eternity' é um álbum “profundamente íntimo, construído ao longo de quase dois anos e algumas lágrimas”

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Monday é o nome artístico de Catarina Falcão, uma das vozes do momento no panorama da música alternativa portuguesa. Depois do EP Room For All (2020), a artista apresenta Underwater, feels like eternity, um álbum composto por dez canções que navegam por sonoridades entre a pop e a folk, e que refletem sobre autoconhecimento, aprendizagem e alguma nostalgia. A 22 de junho, há concerto na sala LISA da Rua das Gaivotas.

Como escolheste o teu nome artístico?

Tive dificuldade em encontrar um nome. Não sabia o que havia de ser, porque não gosto do nome Catarina Falcão, ou Cat Falcão. Queria que fosse só um nome, como Cher [risos], e lembrei-me de Monday. Na altura estava com a Mané, que tem feito os meus grafismos, e ela achou que era um nome feminino, que tinha qualquer coisa que faz sentido com a minha música. Por outro lado, gosto de segundas-feiras, acho que tem uma conotação meio romântica. Mas é mau para motores de busca. Foi muito mal pensado do meu lado [risos].

Sempre quiseste ser cantora?

Acho que a música surgiu de forma muito natural. Éramos três em casa da minha mãe. Temos mais irmãs, mas a primeira colheita – como nós gostamos de chamar – era a Margarida, eu e a Marta. A nossa mãe sempre ouviu muita música em casa e gostava muito de cantar também. Nós imitávamos e começávamos a cantar as três. Andámos no Coro de Santo Amaro de Oeiras quando éramos pequenas, que era ao lado de nossa casa. Cheguei a ir cantar no Natal dos Hospitais à noite. Cantar em casa, harmonizar, foi sempre natural, era a nossa realidade. Um bocadinho mais tarde, por volta dos 12 anos, a Margarida e eu começámos a compor. Na altura escrevemos uma música para a nossa igreja. Íamos à missa (a minha mãe obrigava-nos a ir todos os domingos), e então escrevemos uma música para cantarmos lá. A nossa primeira atuação foi na igreja. Entretanto comecei a ter aulas de guitarra de uma forma muito informal e fui aprendendo com os meus amigos e com aquilo que andava a ouvir.

A certa altura, tu e a tua irmã Margarida criaram as Golden Slumbers…

Foi a Margarida que me forçou [risos]. Na altura, ela foi ver um concerto de Bon Iver e a banda que fez a primeira parte foi o trio The Staves, três irmãs que fazem música folk. Ela achou incrível e quis tentar fazer qualquer coisa do mesmo género. Então, falou comigo, se calhar porque ouvíamos música mais parecida na altura e também estávamos a descobrir artistas mais ligadas à folk. No início era um bocado essa a linguagem que nos unia e começámos a compor. Mas foi a Margarida a força motriz para começar.

Nunca tinhas pensado nisso?

Acho que sim, mas se calhar tinha mais medo do que ela. Mas ainda bem que ela insistiu.

E de onde veio essa tendência para ouvir folk?

Ouvíamos muito Simon & Garfunkel ou Billy Joel, por exemplo. Quando éramos pequenas, era muita pop: Britney Spears, Spice Girls, Christina Aguilera… Mais tarde começámos a ouvir um cancioneiro mais folk, especialmente Simon & Garfunkel porque a minha mãe gostava muito. Pelos 15 anos, namorei com um rapaz que me deu a conhecer imensa música. Foi ele que mostrou Feist, Cat Power, Yeah Yeah Yeahs, Joni Mitchell, Laura Marling, que é uma das minhas grandes referências. Depois comecei a mostrar também à Margarida. Foi também nessa altura que apareceram os Mumford & Sons e nós gostávamos imenso, apesar de serem um bocadinho mais comerciais. Houve ali uma altura em que o indie-folk também estava mais na berra.

Cantas habitualmente em inglês, mas em 2020 fizeste uma perninha em Cedo, do disco Canções do Pós-guerra (2020), do Samuel Úria. Como surgiu o convite?

Em 2017, O Samuel pediu a mim e à Margarida que interpretássemos o tema dele no Festival da Canção [Para Perto]. Ficámos amigos e, um dia, ele mandou-me mensagem a dizer “tenho um tema que gostava que cantasses comigo, queres?” E eu: “claro!”. Foi assim, muito simples [risos].

Não foi estranho para ti cantar em português?

Não. Acho mais estranho compor em português do que cantar em português. É mais natural compor em inglês, sempre foi, mas gosto de cantar em português também.

“Escrevi o disco numa altura em que me sentia completamente submersa, como se tivesse sido engolida por uma onda”

O teu novo disco tem um título muito peculiar, Underwater, feels like eternity. Qual é a ideia?

Escrevi o disco numa altura em que me sentia exatamente assim, como o título sugere, que é a ideia de estar completamente submersa, como se tivesse sido engolida por uma onda. Sentia-me assoberbada e não estava a conseguir sair. Ao mesmo tempo, tinha uma sensação de paz. Estou aqui debaixo de água, tenho noção que me estou a afundar, mas não quero saber. Por acaso o título veio um bocado depois, porque escrevi uma música que começa com essa frase e isso fez muito sentido para a narrativa toda.

“Um disco muito íntimo, construído à base de muitas lágrimas”, diz no press release. Sentiste alívio por partilhares as tuas emoções neste disco?

Muitas das canções foram depois regravadas em estúdio, mas algumas das demos literalmente acabavam comigo a fungar… [risos]. Isso aconteceu não só por aquilo que estava a viver e que tive de transmitir para as canções, mas também por todo o processo de produção, de encontrar-me no meio dessa solidão. Sempre trabalhei com pessoas que faziam a coprodução comigo, e neste disco foi a primeira vez que tomei a decisão de ser eu a encontrar-me. Senti que tinha de perceber quem sou e tinha de trabalhar com as pessoas por querer, não por sentir que me faltava alguma competência. Sempre tive a ideia de que um produtor era alguém cheio de capacidade, cheio de conhecimento e de experiência e não me considerava essa pessoa. Sempre foi um lugar meio assustador e inalcançável para mim. De repente, é uma descoberta a nível pessoal, a nível de trabalho.

E agora se alguém te convidasse para ser produtora de um disco, aceitarias?

Adorava, mas dependeria muito dos timings e do projeto.

O mais recente single, Habits, tem colaboração de Afonso Cabral. Como surgiu esta parceria?

Eu tinha escrito esta canção e sabia que queria fazer um dueto, queria criar esta narrativa que tivesse duas perspetivas. Adoro a voz do Afonso, já o conheço há algum tempo, já tínhamos inclusive cantado com os You Can’t Win Charlie Brown num concerto no CCB, e lembrei-me de o convidar, de mandar mensagem pelo Instagram a perguntar se queria cantar uma música comigo. Pedi-lhe para ele escrever o verso que ia cantar, gostava de ter a perspetiva dele. Fez tudo num dia e meio e acertou na mouche.

No dia 22 apresentas este disco na Sala Lisa. Como vai ser?

Vamos ser três em palco, vou tocar com dois irmãos, o João e o Miguel Avelar. Vamos apresentar o disco todo e algumas canções do EP e também do meu primeiro disco. Estou muito entusiasmada, acho que é a primeira vez que vou estar a apresentar canções onde me sinto inteiramente eu, onde não há nada que seja feito pela mão de outra pessoa. Faz imenso sentido neste momento, estou entusiasmada por poder mostrar isso ao vivo.

Já tens mais canções em gaveta para um próximo trabalho?

Há sempre canções que ficam de fora de um disco e penso sempre na vida que podem ganhar a seguir. Ainda não estou a pensar muito concretamente em nada, mas claro que tenho vontade de fazer mais coisas e de explorar outros lugares- Mas, se calhar, antes de Monday sai qualquer coisa de Golden Slumbers.

Estão a trabalhar em alguma coisa?

Sim, estamos a compor.

Consegues fazer bem essa divisão do que é a tua música enquanto Monday e enquanto metade das Golden Slumbers?

Estou a descobrir ainda [risos]. É um caminho que se vai fazendo. Acho que a partir do momento em que digo à Margarida que tenho uma música, ela quer gravar logo. Mesmo que depois eu fique a pensar que se calhar devia ter ficado para mim [risos]… Acho que qualquer pessoa que tenha um projeto seu, tem sempre outros mil projetos. É muito difícil canalizar tudo num só sítio, acho até pouco saudável. É bom ter vários espaços, lidar com várias pessoas e aprender de várias formas.

O que andas a ouvir?

Ando a ouvir o novo disco da Billie Eilish. A minha irmã Matilde, uma das mais novas, é muito obcecada, acho que ela sente as coisas com outra intensidade e está sempre a insistir comigo para eu ouvir determinada música… Também ando a ouvir Chappel Roan; o novo disco da Willow Smith, Empathogen, de jazz e fusão experimental. Também ando a ouvir Hohnen Ford, que tem um lado meio jazzístico, e que tem uma voz mesmo bonita.