São Luiz recebe Pessoa segundo Bob Wilson

Espetáculo do mestre norte-americano marca nova temporada recheada de concertos

São Luiz recebe Pessoa segundo Bob Wilson

Garantidamente, esta é uma nova temporada repleta de grandes momentos de criação artística. Até julho do próximo ano, nos palcos do eclético Teatro São Luiz há lugar para o teatro e a dança, para a música e para a ópera, para a literatura, a ciência e o pensamento. São dezenas de propostas para, segundo o diretor artístico Miguel Loureiro, continuar a fazer do teatro municipal lugar "central" de "uma vida artística efervescente de criadores e agentes culturais lisboetas, nacionais e internacionais".

Lenda viva do teatro contemporâneo, o mestre norte-americano Robert Wilson volta a Lisboa, no próximo ano, com PESSOA – Since I’ve Been Me, uma evocação das diversas atmosferas das obras e das heteronímias do poeta português Fernando Pessoa, precisamente nascido a dois passos do Teatro São Luiz, no Largo de São Carlos.

Coprodução entre o teatro municipal lisboeta, o florentino Teatro della Pergola e o parisiense Théâtre de la Ville, esta “última rêverie” de Bob Wilson, como lhe chama o diretor artístico Miguel Loureiro, tem dramaturgia de Darryl Pinckney – colaborador habitual de Wilson, autor do magnífico Mary said what she said, espetáculo que marcou a edição de 2019 do Festival de Almada – e conta com um elenco internacional onde se destaca a atriz Maria de Medeiros. Estes ingredientes fazem de PESSOA – Since I’ve Been Me um dos espetáculos mais aguardados da próxima temporada e, uma vez que são apenas duas récitas (a 7 e 8 de março), a julgar pelas anteriores passagens do teatro de Wilson por Portugal os bilhetes tendem a esgotar depressa.

Mas, a temporada do São Luiz está longe de se resumir  a este “acontecimento”. Muitas são as propostas de teatro que a temporada 2024/2025 elenca, a começar já em setembro, quando Ivo Alexandre apresentar a sua visão de Amedée ou Como Desembaraçar-se (de 20 a 29), marco no teatro do absurdo da autoria do dramaturgo franco-romeno Eugène Ionesco.

Os grandes autores estão, aliás, em destaque, com Arthur Miller e As Bruxas de Salém, encenado por Nuno Cardoso (13 a 15 de dezembro); Shakespeare por Miguel Moreira e Útero, com Hamlet – L’ Ange du Bizarre (19 a 22 de dezembro); Nathalie Sarraute e as peças Por tudo e por nada e Aqui está ela encenadas por Carla Bolito, num espetáculo intitulado Tudo A Que Se Chama Nada (11 a 26 de janeiro); Heiner Müller e Macbeth, segundo Paulo Castro, encenador português residente na Austrália de regresso a Lisboa (14 a 23 de fevereiro); ou Heinrich Von Kleist por Maria Duarte, numa criação ainda sem título definitivo (22 a 30 de março). A fechar a temporada, Jean Paul Bucchieri leva ao palco o Livro XI das Confissões de Santo Agostinho, com Bárbara Branco, Cláudio da Silva, Maria Arriaga e Pedro Lacerda no elenco (28 de junho a 5 de julho); e Renata Portas encena a versão de Séneca de As Troianas (10 a 13 de julho).

Ainda no teatro, Teresa Sobral dirige Class Enemy, peça do final da década de 1970 do britânico Nigel Williams (12 a 27 de outubro); Cucha Carvalheiro celebra os 30 anos da Escola de Mulheres com a encenação de um inédito de Ana Lázaro intitulado Deseja-se Fernanda!, dedicado, precisamente, à fundadora daquela companhia, Fernanda Lapa (15 a 23 de março); e a Assédio, companhia do Porto, apresenta uma reflexão sobre a guerra colonial, com A Tragédia de Aristides Inhassoro, de Pedro Galiza (24 a 27 de abril). A programação inclui ainda criações de Hotel Europa (Urgência Climática), Raquel André (Belonging / E di / Pertenencia / Zugehörigkeit / Pertença / 絆), Os Possessos (Last Call), Lígia Soares (Romance), Marco Paiva (A Tempo) e Miguel Graça (Killer Joe). Pelos palcos do São Luiz passam ainda, como é habitual, os festivais Alkantara e FIMFA Lx.

Num rápido virar de página, a dança e a performance estão também em grande destaque. Para a temporada, Miguel Loureiro começa logo, em setembro, por apostar num programa duplo com dois espetáculos do coletivo Dançando com a Diferença – Blasons, de François Chaignaud, estreado em 2022, e Doesdicon, criado por Tânia Carvalho em 2017 (de 19 a 21); e, de novo Tânia Carvalho, mas desta vez ao lado de Matthieu Ehrlacher, no projeto que a dupla vem desenvolvendo desde 2021, Papillons d’éternité, com a peça Nymphalis Antiopa, criada e interpretada por ambos.

Nos próximos meses, a marcar a agenda cultural da cidade estão Rui Horta (o coreógrafo assina Glimmer com os Micro Audio Waves, um espetáculo musical, performático e multimédia, com a participação de Gaya de Medeiros), Catarina Miranda (Atsumori), Vânia Rovisco (No Corpo: Assim se Conhece o Mundo), Filipa Francisco e Bruno Cochat (NU MEIO e NU MEIO Comvida, com participações de Félix Lozano, Sónia Batista, Margarida Mestre, Miguel Pereira e Carlota Lagido), Circolando (OU) e Olga Roriz (O Salvado). Na performance, destacam-se Ritó Natálio, com Spillovers, a partir de Lesbian peoples: material for a dictionary, de Monique Wittig e Sande Zeig; o regresso de Romain Beltrão Teule, com Dobra; e e(u)co(m)lógica de José Laginha, uma criação para jovens que cruza a crise climática com o funcionamento do cérebro humano.

O lugar da música

Desde o primeiro minuto enquanto diretor artístico do Teatro São Luiz, Miguel Loureiro assumiu uma forte aposta na programação de música. A temporada que se avizinha coloca o teatro municipal no epicentro da oferta, e a música em paridade com as artes performativas. Sinal evidente é a temporada abrir “com dois concertos em formato diverso” de Júlio Resende. O talentoso pianista apresenta, a 13 de setembro, Fado Jazz – Filhos da Revolução, e na noite seguinte, ao lado dos ALMO (o tenor Paulo Lapa e o barítono Tiago Matos), uma viagem surpreendente pelo fado e pelo cancioneiro português. Nesse fim de semana, na noite de sexta-feira 13, o músico, coreógrafo, bailarino e DJ Faizal Mostrixx, pioneiro da eletrónica tribal, é “mestre de cerimónias” da festa de abertura da temporada.

Até final do ano, entre outros, estão agendados concertos de MirAnda (24 de setembro), Samuel Úria (8 de outubro), Rafael Riqueni (11 de outubro), Maria João & André Mehmari (8 de novembro), Tony Ann (9 de novembro), Rocío Márquez & Bronquio (10 de novembro), Lena d’Água (12 de novembro), Sara Correia (25 de novembro), LINA_ (27 de novembro), Cara de Espelho (29 de novembro), Cristina Branco (5 de dezembro) e Kavita Shah (20 de dezembro). Para além de um grande concerto comemorativo do centenário de Amílcar Cabral (6 de novembro) e dos últimos dois momentos do ciclo Foco Maestro com Martim Sousa Tavares (em dezembro), o Dia Mundial da Música (1 de outubro) é celebrado com o espetáculo Cantexto, dedicado ao cante alentejano, que conta com a presença de oito grupos de cantadores.

Com o fecho do Teatro Nacional de São Carlos para obras de beneficiação, o São Luiz acolhe alguns dos espetáculos integrados na programação do teatro vizinho, nomeadamente na música de câmara e na ópera.

Em 2025, pelas três salas do São Luiz passam também Pedro Jóia, Orquestra Metropolitana de Lisboa (destaque para o concerto celebrativo do centenário de Carlos Paredes), Kolme, Nuno Vieira de Almeida (com Rita Blanco), Orquestra do Hot Clube Portugal ou Nuno Côrte-Real.

A temporada tem ainda uma alargada oferta no campo do pensamento e da ciência, salientando-se mais uma edição do ciclo O Nosso Futuro Ainda Humano, que abre a 17 de setembro com o filósofo e ensaísta basco Daniel Innerarity.

No campo da literatura, de notar a leitura encenada de O Mundo Começou às 5 e 47 para assinalar os 100 anos de Luiz Francisco Rebello. A 15 de setembro, a partir das 16 horas, com Marques d’ Arede, Ivo Alexandre, Marco Mendonça, Álvaro Correia, Cátia Nunes, Diogo Fernandes e Márcia Cardoso, sob direção de Miguel Sopas.

A concluir, em novembro, uma instalação sonora assinala o 30.º aniversário da Galeria Zé dos Bois e, já em 2025, o coletivo Filho Único propõe uma programação especial para três dias. Isto, ao pormenor, e tudo o resto, pode ser consultado no site oficial do São Luiz Teatro Municipal.