música
Um canto a José Mário Branco
Canto Nono celebra o músico e compositor no Teatro Maria Matos
A 1 de maio, Dia do Trabalhador, José Mário Branco é evocado através da recriação da sua obra pelo Canto Nono, um conjunto de oito vozes a capella. O grupo manteve uma cumplicidade e convivência artística de 20 anos com o compositor, arranjador, cantautor e produtor musical. À conversa com Fernando Pinheiro, este membro do Canto Nono não só recordou essa ligação tão especial, como ainda levantou o véu sobre o espetáculo no Teatro Maria Matos.
São dele temas incontornáveis da música popular portuguesa como Inquietação, Qual é a tua, ó meu, Eu vim de longe, eu vou pra longe ou Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, para referir apenas alguns. Considerado um dos grandes nomes da música portuguesa, o músico, cantautor e produtor musical José Mário Branco trabalhou com nomes como Sérgio Godinho, Camané, Fausto, Janita Salomé, Amélia Muge ou Carlos do Carmo.
Entre 2000 e 2019, ano da sua morte, José Mário Branco foi diretor artístico do grupo coral a capella Canto Nono, constituído por Dalila Teixeira, Joana Castro, Diana Gonçalves, Daniela Leite Castro, Lucas Lopes, Jorge Barata, Rui Rodrigues e Fernando Pinheiro. Agora, o octeto traz para o palco do Maria Matos o espetáculo A força (o poder) da palavra – Um canto a José Mário Branco.
Segundo um dos seus membros, Fernando Pinheiro, esta “é a consequência lógica de uma cumplicidade construída ao longo de 20 anos”. O seu desaparecimento inesperado deixou o país culturalmente mais pobre, mas também mais triste. O grupo “ressentiu-se imenso. A vivência artística que tínhamos com ele era muito forte, mas a vivência pessoal era fortíssima”, esclarece.
Depois da morte do mestre, veio a pandemia, e durante esse período tão atípico, o grupo “bateu fundo. Estávamos todos um bocadinho perdidos, não sabíamos o que fazer até surgiu a ideia de aproveitar esta história pessoal e musical que tivemos com o Zé Mário Branco.”
Surgiu, assim, a intensão de pôr de pé este concerto, que é também uma homenagem à palavra, “uma constante na obra do Zé Mário. A sua força e o seu poder sobressaíam sempre.”
Depois de lançada a ideia, foi preciso escolher o repertório, o que revelou ser uma tarefa árdua. “O Zé Mário criou muitas obras para teatro e cinema, para outros cantores enquanto arranjador. Queríamos que o espetáculo tocasse em todos estes lados, mas quando nos apercebemos tínhamos cerca de 40 músicas”. De fora tiveram de ficar muitas canções especiais, mas ainda assim o alinhamento conta com 17 temas.
Para este concerto, o Canto Nono conta com várias colaborações de músicos especiais para José Mário Branco: “ele prezava muito a relação pessoal, por isso desafiámos algumas pessoas que eram importantes para ele a fazerem novos arranjos.”
“Falámos com a Amélia Muge e o Zé Martins (ex-Trovante); o Tomás Pimentel (um homem dos sopros); o pianista Filipe Raposo (que, como dizia o Zé Mário, era um dos grandes talentosos instrumentistas da nova geração), e o Zé Manuel David, dos Gaiteiros de Lisboa”. Os novos arranjos revelaram ser “surpresas muito interessantes. A Amélia Muge e o Zé Martins fizeram um arranjo juntos para a canção Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, que ficou extraordinário”, confidencia.
Para o grupo, a ideia deste espetáculo era fazer uma “reconstrução da obra executada”. Foi partindo desse princípio que o Canto Nono quis lembrar o seu mentor: “as pessoas falam de homenagens e tributos, mas eu raramente uso essas expressões, até porque o Zé Mário era muito avesso a essas coisas”.
Antes da atuação em Lisboa, o Canto Nono atuou no Coliseu do Porto, a 28 de abril, num espetáculo que foi gravado. “A ideia é ter um disco ao vivo. São quase dois anos a trabalhar neste espetáculo pelo que seria uma pena não haver um registo para a posteridade”. Depois do Maria Matos, o Canto Nono ruma ainda mais a sul, para apresentar o projeto em Loulé, a 13 maio.