Mais do que um hotel, um museu

O MACAM - Museu de Arte Contemporânea Armando Martins abre a 22 de março

Mais do que um hotel, um museu

Nasceu da vontade do empresário Armando Martins de mostrar a sua coleção pessoal de arte, que inclui mais de 600 obras, desde o final do século XIX até à atualidade. O MACAM, com abertura agendada para o dia 22 deste mês, junta, no mesmo espaço, um museu e um hotel de cinco estrelas, um conceito inovador e o primeiro do género, tanto em Portugal como na Europa.

Foi aos 18 anos que Armando Martins (n. 1949) se começou a interessar pelas artes visuais e pelo colecionismo, quando adquiria serigrafias em parceria com um amigo. No dia em que fez 25 anos, a 22 de março de 1974, ofereceu-se a sua primeira obra de arte original: um quadro abstrato de Rogério Ribeiro.

“Foram as cores”, diz o colecionador, acrescentando que “a arte abstrata tem uma vantagem: olha-se para ela e vê-se o que se quiser. E todos os dias se podem fazer leituras diferentes. É por isso que continuo a gostar deste quadro tanto como quando o comprei, há quase 51 anos”.

O empresário ao lado de uma pintura de Rogério Ribeiro, a sua primeira aquisição

Desde aí, Armando Martins tem vindo a adquirir arte moderna e contemporânea para sua coleção, em constante atualização. E se até finais dos anos 90 do século passado o fundador só comprava peças de artistas portugueses como José Malhoa, Amadeo Sousa Cardoso, Santa-Rita, Eduardo Viana, Almada Negreiros, Júlio Pomar, Noronha da Costa, Paula Rego ou Julião Sarmento, a partir de 2000 começou a adquirir também obras de arte internacional.

O desejo de fundar um museu para partilhar a sua coleção com o público começou há muito, mas foi com a aquisição a título privado do Palácio dos Condes da Ribeira Grande, na Rua da Junqueira, em 2007, que esta vontade começou a ganhar forma. “Só faz sentido ter uma coleção se for para ser exposta. Acho que este é um caminho que outros deviam seguir, até porque constitui uma riqueza para a cidade, para o país e para todos nós”, acrescenta.

Os diferentes espaços do Museu que é também um hotel

Instalado no edifício histórico do Palácio Condes da Ribeira Grande, que remonta ao início do século XVIII, o MACAM compreende um total de 13 mil metros quadrados, dois mil dos quais de espaço expositivo. A reabilitação do edifício, a cargo do estúdio de arquitetura português MetroUrbe, procurou uma relação harmoniosa entre o palácio – onde na zona térrea se encontram as galerias e na zona superior o hotel -, e a extensão contemporânea que alberga o programa de exposições temporárias do museu.

A fachada desta nova ala – premiada na edição deste ano dos Surface Design Awards, em Londres – é revestida por uma série de azulejos tridimensionais da autoria da artista e ceramista Maria Ana Vasco Costa. Já o hotel, criado como motor de financiamento e de sustentação da autonomia do projeto, dispõe de 64 quartos personalizados, cada um oferecendo uma experiência artística única, já que cada quarto conta com obras da coleção MACAM, assim como o corredor e os terraços exteriores.

Edifício dedicado às exposições temporárias do museu, com fachada da autoria de Maria Ana Vasco Costa
Os azulejos de Maria Ana Vasco Costa e a escultura de Pedro Cabrita Reis

Na impossibilidade de expor as mais de 600 peças que constituem a coleção, o MACAM vai mostrar, para já, cerca de 210, resultante de “uma escolha curatorial, que tem a ver com a representatividade de artistas e com os diálogos possíveis”, esclarece Adelaide Ginga, diretora do MACAM.

A historiadora de arte e curadora explica como esta coleção se organiza no espaço: “No palácio, temos duas galerias que vão mostrar em permanência uma parte da coleção. A Galeria 1 é dedicada àquele que foi o primeiro núcleo da coleção, constituído em torno da arte portuguesa, e que tem um percurso cronológico sobre peças muito representativas daquilo que é a história da arte desde o final do século XIX até ao final dos anos 80 do século XX. Na Galeria 2, que reúne arte contemporânea portuguesa e internacional, a organização já não é cronológica, faz-se por núcleos temáticos, onde as obras portuguesas dialogam com as estrangeiras.”

Sob o mote The House of Private Collections (A Casa das Coleções Privadas), o MACAM não mostrará apenas a coleção pessoal de arte do seu fundador, mas convidará também outros colecionadores privados a mostrar as suas coleções, reforçando a missão de as tornar visíveis ao público. Isto acontecerá no edifício novo, dedicado às exposições temporárias, que conta com duas salas que permitem mostrar obras de maior escala.

Confiante e feliz por aquilo que o MACAM vai trazer à zona de Belém, onde existem outros museus como o MAAT ou o MAC/CCB dedicados à arte contemporânea, Adelaide Ginga considera importante a distinção que existe entre eles, bem como a relação de complementaridade.

A diretora salienta “fazer falta em Lisboa uma exposição permanente que represente a evolução da arte portuguesa do século XX”, e acrescenta: “aqui no MACAM, tendo quatro galerias, vale a pena dedicar duas delas a uma mostra permanente que permite conhecer arte portuguesa contemporânea. É muito bom o público saber que determinada coleção tem um conjunto de obras emblemáticas e poder ter acesso a elas.”

O Live Arts Bar na antiga capela

O Live Arts Bar situa-se na capela do edifício, datada do século XVIII, dessacralizada, restaurada e transformada em local de eventos culturais. A programação destinada quer aos hóspedes do hotel, quer ao público em geral, pretende dinamizar toda a zona da Junqueira, através das artes preformativas, da música e da palavra.

Adelaide Ginga sublinha ser “muito importante que a palavra volte a ganhar dimensão de espetáculo. Queremos estimular o gosto de ouvir poemas, de declamar, de conhecer a literatura e a poesia e valorizá-lo na articulação com a música, num ambiente cuidado e intimista”.

A antiga capela vai ser agora um espaço dedicado a artes performativas

A abertura do MACAM está agendada para dia 22, uma data que tem um significado especial: além de ser o aniversário de Armando Martins, coincide também com a aquisição da sua primeira obra original. A inauguração do museu será marcada por três dias de eventos e atividades de entrada gratuita a anunciar em breve.