sugestão
Os livros do verão
Oito livros para ler nas férias
A 90.ª Feira do Livro de Lisboa foi adiada para as datas de 27 de agosto a 13 de Setembro. No Parque Eduardo VII, este ano, os livros e os seus autores vão ser celebrados em pleno verão. As férias que se avizinham, são um período propício a leituras de maior fôlego. Deixamos-lhe oito sugestões, da poesia eterna de Camões ao romance policial, do ensaio à historiografia, da belíssima novela de James Baldwin, O Quarto de Giovanni, à obra monumental e inclassificável de T.E Lawrence, Os Sete Pilares da Sabedoria. Sem esquecer o centenário de nascimento da Voz de Portugal, Amália Rodrigues, através de uma biografia da genial cantora, dedicada aos jovens leitores. Estes e muitos outros livros, esperam por si, na Feira do Livro ou na livraria mais perto de casa. Bom verão, felizes leituras.
Luís de Camões
Sonetos escolhidos por Eugénio de Andrade
Helder Macedo escreve no volume de ensaios Camões e Outros Contemporâneos: “O mundo de valores em transição que foi o seu [de Camões] é ainda o nosso. A nossa contraditória diversidade já era a dele. Ele é porventura mais velho mas, por isso o mais sábio dos nossos contemporâneos. (…) Quando Camões fala do seu tempo, está também a falar do nosso tempo e para o nosso tempo”. Certo dia, um amigo perguntou a Eugénio de Andrade qual o era o mais fascinante livro de poesia escrito em português e recebeu a seguinte resposta: “O livro de sonetos de Camões escolhidos por mim”. Estes 50 poemas de Luís de Camões, selecionados e apresentados por Eugénio de Andrade, “participam da respiração do mundo e da pulsação das estrelas” e servem “para espelho da nossa aflição, ou consolo dessa errância sem destino, em busca de algum paraíso que só tem forma e figura na nossa imaginação”. A presente obra, objeto de reedição, vinte anos volvidos sobre a impressão original, celebra um grande poeta “do nosso tempo e para o nosso tempo”.
Assírio & Alvim
James Baldwin
O Quarto de Giovanni
James Baldwin (1924-1987) nasceu no Harlem, onde cresceu e estudou. Em 1948, partiu para França, fugindo ao racismo e homofobia dos EUA: “Acabei nas ruas de Paris, com quarenta dólares no bolso, mas com a convicção de que nada de pior me podia acontecer do que já me tinha acontecido no meu país”. Romancista, ensaísta, poeta e ativista dos direitos civis, foi, com Gore Vidal, um dos mais lúcidos espíritos críticos que a América produziu no século XX e um dos seus maiores intérpretes. O Quarto de Giovanni, obra intimista de profundo recorte clássico, estruturada numa longa analepse, é, à semelhança de Se Esta Rua Falasse, uma dilacerante história de amor. Neste caso, porém, os amantes são vítimas de uma discriminação que não lhes é apenas exterior. David um jovem americano em Paris, longe da noiva, envolve-se passionalmente com Giovanni, um italiano. Incapaz de afrontar a moral vigente e a normalidade de uma vida segura, finge que a ligação nunca existiu enquanto Giovanni se afunda na tragédia. Tragédia que se abate também, inexorável, sobre aquele “que mentiu, viveu a mentira e acreditou nela”.
Alfaguara
Silvia Federici
Calibã e a Bruxa
“É o processo extraordinário / da Feiticeira Cotovia / Que diz que que as roseiras ao contrário / É que dão rosas e é que há poesia.” Natália Correia, num admirável poema, celebra o poder transgressor da Feiticeira Cotovia, condenada á fogueira num auto da inquisição. Também o presente ensaio de Silvia Federici se concentra no poder subversivo da bruxa, desafiador das estruturas de poder. A obra reconstitui as lutas anti-feudais da Idade Média e as lutas mediante as quais o proletariado resistiu ao surgimento do capitalismo. O estudo centra-se nas figuras de Calibã (“uma besta que tinha que ser mantida sob controlo”) símbolo do proletariado, e da bruxa, considerando a caça às bruxas uma campanha de terror contra as mulheres determinante na construção de uma nova ordem patriarcal em que os seus corpos, a sua mão-de-obra e as suas capacidades sexuais e reprodutoras foram postas sob o controlo do Estado e transformados em recursos económicos. Um texto marcante dedicado aos protagonistas de uma luta ainda em curso: mulheres, sujeitos coloniais, descendentes de escravos africanos, imigrantes deslocados pela globalização.
Orfeu Negro
T.E. Lawrence
Os Sete Pilares da Sabedoria
Lawrence da Arábia, filme de David Lean, é por muitos considerado um dos modelos da superprodução cinematográfica. Não será, porém, exagerado salientar que quase quatro horas de imagens sumptuosas compostas por pores-do-sol, dunas do deserto e camelos, muito pouco ou quase nada é revelado sobre o caráter, as motivações ou a psicologia do seu protagonista: T. E. Lawrence. A leitura de Os Sete Pilares da Sabedoria constitui o meio ideal para descobrir a personalidade rica e complexa desta figura lendária. O livro descreve os dois anos que o autor dedicou à revolta árabe enquanto membro das forças rebeldes, durante a Grande Guerra contra os turcos, aliados dos alemães. Nesta obra monumental – autobiografia romanceada, livro de aventuras (“aventura sublime”, chamou-lhe Robert Graves), texto literário, estudo notável sobre a descoberta do outro e da diferença, diário pessoal e militar sobre a guerra e livro extraordinário sobre a vontade de autodeterminação de um povo – transmite a sua visão etno-antropológica sobre o mundo árabe que sempre o fascinou. Este livro inclassificável é uma das obras literárias mais singulares do seculo XX.
E-Primatur
Miguel Szymansky
O Grande Pagode
O escritor luso-alemão Miguel Szymansky publicou o primeiro romance da série Marcelo Silva, Ouro Prata e Silva, em 2019. A obra mereceu a seguinte apreciação do escritor e crítico literário Miguel Real, no Jornal de Letras: “(…) finalmente após o escândalo financeiro nos jornais, temos um romance sobre a falência do BES. (…) Assumindo todas as características de um romance policial, é, porém, mais do que um mero policial de entretenimento”. A segunda investigação do jornalista Marcelo Silva acontece no momento em que Portugal está prestes a assinar com a China um acordo que ameaça tudo e todos: do meio ambiente à liberdade, dos habitantes dos bairros clandestinos na margem sul aos políticos que se opõem à hegemonia de Pequim. Ancorado no rio Tejo, entre a Trafaria e Belém, o iate de um bilionário chinês é o principal tema de conversa na cidade. Fragilizado por meses de solidão e uma crise emocional, Marcelo Silva só pensa em refazer a sua vida. Mas, sem perceber como, acaba, por se ver envolvido numa série de acontecimentos: um livro desaparece de circulação, uma ministra torna-se vítima de chantagem, um homem aparece morto numa praia de Sintra.
Suma de Letras
António Correia & Ernesto Matos
Lisboa Lux Candens
A mítica luz de Lisboa transformou-se num ícone imaterial da cidade, exercendo uma profunda sedução e inspirando manifestações artísticas e culturais, ao longo dos tempos. Lisboa Lux Candens é um álbum que reúne fotografias de Ernesto Matos (fotógrafo e autor com um amplo trabalho desenvolvido em torno da calçada portuguesa, justamente, um dos múltiplos factores que influi na luz de Lisboa, formada por materiais que ajudam na sua reflexão) à poesia de António Correia, poeta contista e romancista. Às fotografias de Matos, sobrepõem-se os apontamentos poéticos de António Correia. Edição trilingue, português/mandarim/ inglês, assume-se como uma viagem à iluminada cidade de Lisboa, das nuances de ouro e de prata, das viagens etéreas e transcendentais. “Um livro de bolso para viajar no interior de nós mesmos, para nos perdermos e reencontrarmos com a cidade de Ulisses, esta mesma que o Sol abençoou nestas 176 páginas”.
Mytus de Er
No Bicentenário da Revolução Liberal
Da Revolução à Constituição, 1820-1822
Este livro é expressamente dedicado a Manuel Fernandes Tomás e a José Ferreira Borges, o primeiro como estratega e doutrinador, o segundo como comandante operacional da Revolução Liberal em Portugal, porque “como muitas outras vezes no passado, o engenho e acção dos líderes são essenciais nas grandes façanhas da história”. O primeiro de uma série de três obras evocativas do bicentenário da Revolução Liberal, investiga um movimento político que antes de mais, pôs fim ao despotismo da Monarquia absoluta, limitou o poder do Estado e instaurou as liberdades individuais. Seguidamente, institucionalizou constitucionalmente um novo regime político, baseado na soberania da Nação, no poder político representativo, através de um parlamento eleito, na separação de poderes e na subordinação do Governo à lei. Com a nova era constitucional, os portugueses deixaram de ser súbditos de um poder alheio, sem direitos, para passarem a ser cidadãos de pleno direito, titulares de direitos políticos, nomeadamente o de elegerem a representação nacional. Duzentos anos depois, somos ainda beneficiários da liberdade política e da cidadania que a Revolução Liberal nos legou.
Porto Editora
Carminho & Tiago Albuquerque
Amália, Já Sei Quem És
Amália, Já sei quem, biografia escrita pela fadista Carminho em homenagem a Amália Rodrigues, por ocasião do 100.º aniversário de nascimento da grande diva do fado, é um livro destinado aos mais pequenos. A obra escrita em sextilhas – uma das formas poéticas próprias daquele estilo musical tradicional – conta uma história de vida fascinante e está repleto de pequenos tesouros e pormenores pouco conhecidos do grande público. Com esta biografia infantil, publicada em parceria com o Museu do Fado/EGEAC, Carminho espera despertar nas crianças a admiração que ela própria sente por aquela que acabou aclamada como “a voz de Portugal”. As ilustrações de Tiago Albuquerque prometem levar os pequenos leitores aos principais lugares que marcaram a vida de Amália, que começou a cantar quando era pequena e ainda hoje, passados quase 21 anos da sua morte, continua a inspirar muitos cantores pelo mundo fora. (texto de Ana Rita Vaz)